08 fevereiro 2011

Uma Chance à Literatura Brasileira

Muitos jovens alegam não gostar dos livros nacionais. Dizem que a Literatura Brasileira é chata, pesada ou ainda, que muitas vezes trata de assuntos desinteressantes, com linguagem complicada e pouco atraente a quem busca dinamismo, ação e emoções. Fortes emoções.

   Se você é um destes jovens, tudo bem. Com algumas dicas, tentaremos te convencer de que nem só de clássicos com palavras difíceis vive o universo literário brasileiro.

Situação: Você está no Ensino Médio e não há uma só disciplina que não aborde o tema vestibular. Em Literatura não seria diferente: os livros que caem na lista da Fuvest e Unicamp são INEVITAVELMENTE solicitados aos alunos.
   Autores como Machado de Assis, José de Alencar, Guimarães Rosa, José Américo de Almeida, João Cabral de Melo Neto, Euclides da Cunha e Lima Barreto, por exemplo, têm seus livros preenchendo quase todas as estantes da biblioteca e quando você pega um deles para ler sente-se inútil. Sem o dicionário, impossível. É aí que está um dos grandes erros de quem educa, o que talvez te faça crer em um sentimento seu de repúdio à literatura. Puro engano, que fique claro.
Consequência: Você fica traumatizado e passa a amaldiçoar cada novo clássico que passa por suas mãos num domingo preguiçoso e chuvoso que antecede a prova de Literatura. O que é uma lástima...

   Já diziam vários inominados que não há neste mundo quem não goste de ler, há apenas quem ainda não encontrou o livro certo, aquele que o impulsionará a ir atrás de outro, outro e outro...
   Uns encontram o livro certo mais cedo, logo quando aprendem a ler. Outros o encontram no meio do percurso, um pouco mais velhos. E outros simplesmente desistem... Algo que nós não queremos que vocês também façam!
   Talvez esse também não seja o seu problema... Você já gosta de ler, certo? Mas evita ao extremo qualquer título assinado por um brasileiro, pois acredita que só de Capitus e Bentinhos viva a nossa literatura. Um erro e um grande preconceito, não só seu, porém de muitos outros jovens que, sem sequer conhecer o produto das suas origens, adquirem bestsellers americanos em massa. Olá, Brasil! Nós também produzimos livros, e de qualidade, senhores, senhoras e senhoritas!
   Para resolver esse problema, selecionei três livros brasileiros que poderão proporcionar um grande prazer a todos vocês, e sem terem que consultar um dicionário o tempo todo, ainda que seja bom para adquirir um vocabulário mais extenso...

1. De Amor e Amizade – Crônicas para Jovens, Clarice Lispector
Rocco Jovens Leitores | Na cotação: R$13,79 a R$20,00 | Na Submarino

   Clarice Lispector, embora também seja pedida em muitas listas de vestibular, não faz o estereótipo clássico pesado, de folhas amarelas com palavras antiquadas. Clarice é modernista, é inspiradora e encanta com sua forma fascinante e muito palpável de falar sobre sentimentos. E melhor, para jovens.
   As crônicas são leves, rápidas e nos fazem refletir, muitas vezes, sobre situações comuns a respeito de amor e amizade. Uma leitura rápida, leve e deliciosa. Duvido que você não saia adorando Clarice depois deste livro.
   Destaque às crônicas “Amor Imorredouro”, “Quem Escreveu Isto?”, “Por Não Estarem Distraídos”, “Lúcio Cardoso”, “As Dores da Sobrevivência” e “Sérgio Porto”.

“Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria e peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles.”
p. 43 (Por Não Estarem Distraídos)

2. Antes do Baile Verde – Contos, Lygia Fagundes Telles
Companhia das Letras  | Na cotação: R$26,20 a R$37,00 | Fnac

   Para quem gosta de romances longos, é sempre interessante passar pela origem de qualquer um deles: os contos. Um dos textos mais magníficos e versáteis de toda a literatura.
   Lygia Fagundes Telles conduz todos os seus contos com maestria e com uma atmosfera exótica, daquelas que te faz sempre duvidar do que ocorrerá. Os finais surpreendem, e as histórias muitas vezes não têm problemáticas enormes, que envolvam acontecimentos super, ou hiper dramáticos (guerras entre vampiros e lobisomens... agora são anjos, né? Casos à parte) estão vetados. Lygia é autora das minúcias, dos pequenos detalhes que nos rondam no cotidiano, o que apenas contribui para sua genialidade.
   Os contos têm os famosos finais abertos, que sempre deixam um quê de dúvida no ar, uma liberdade gostosa e frases atípicas. Sim, as frases que encerram os contos de Antes do Baile Verde (que dá nome a um conto, diga-se de passagem) são talvez o que há de mais incrível na literatura da autora.
   Destaque aos contos: “Apenas um Saxofone”, “O Moço do Saxofone”, “Antes do Baile Verde”, “Meia-noite em Ponto em Xangai”, “Venha Ver o Pôr do Sol”, “As Pérolas” e “O Menino.”

“Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.”
P. 144 (Venha Ver o Pôr do Sol)

3. Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios, Marçal Aquino
Companhia das Letras  | Na cotação: R$32,90 a R$45,00  | Fnac

    Este livro, na realidade, está na minha lista de desejos. Li ótimas críticas a respeito dele e sou encantada pela história, sem contar o título, que é muito impactante. Belíssimo.
  No momento em que narra os fatos de Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios , o fotógrafo Cauby está convalescendo de um trauma numa pensão barata, numa cidade do Pará que algum tempo antes fora palco de uma corrida do ouro. Sua voz é impregnada da experiência de quem aprendeu todas as regras de sobrevivência no submundo - mas não é do ambiente hostil ao seu redor que ele está falando. O motivo de sua descida ao inferno é Lavínia, a misteriosa e sedutora mulher de Ernani, um pastor evangélico. A trajetória do fotógrafo, dado a premonições e a um humor desencantado, vai sendo explicada por meio de pistas - a história de Chang, morto num escândalo de pedofilia; o mistério de Viktor Laurence, jornalista local que prepara uma vingança silenciosa; a vida de Ernani, que no passado tirou Lavínia das ruas e das drogas. Mesmo diante de todos os riscos, Cauby decide cumprir seu destino com o fatalismo dos personagens trágicos. Nunca acreditei no diabo , diz ele, apenas em pessoas seduzidas pelo mal .
   Deu para notar que o livro é dramático. E aparentemente, ótimo. Quem lê recomenda! E ainda hoje, fuçando pela Internet descobri que ele virou um filme, protagonizado pela Camila Pitanga.

   Espero que algum dos três livros incentive-os a conhecer um pouco mais da literatura moderna brasileira. Eu não dei muitas dicas, pois a postagem ficaria muito grande, entretanto, quem realmente se interessar pelo assunto pode estar procurando por sites, blogs literários (que têm apoiado muito os nossos novos autores) e até a rede social dos leitores, o mais indicado, na minha opinião, Skoob.

   Para quem não se incomoda e, inclusive, gosta dos clássicos, são boas dicas de uma literatura mais contemporânea e atual.
   Para quem ainda alega detestar o produto brasileiro, eu peço paciência. PACIÊNCIA, meus caros. Talvez vocês tenham julgado demais o livro e não tenham se permitido ao prazer que ele poderia ter proporcionado. Quem sabe mais tarde vocês não deem uma nova chance ao título? Acontece com muita gente...
   Para quem está em época de vestibular e deve, inevitavelmente ler os clássicos, que tal perder um pouco daquela neura que outros alunos pregam e curtir o livro, entrar no clima da história? A profundidade sentimental e a complexidade deles contribuem muito para o desenvolvimento da capacidade de interpretação e também produção de texto do aluno e do ser humano. Quanto às palavras difíceis, a preguiça não acrescenta em nada. A preguiça limita e o dicionário está aí para essas coisas. Nada que um Aurélio, um Sacconi ou um Silveira Bueno não resolvam. Novos vocábulos devem ser sempre bem-vindos!
   E se, ainda assim, você diz não gostar de ler. Aguarde e o livro certo estará em suas mãos um dia. Basta ter vontade. Afinal, não é possível que entre milhares, milhões de títulos nenhum te cative, não é mesmo?

    Uma boa semana a todos,

3 comentários:

Mayara disse...

Adorei a postagem, super completaaaa! E não sei se você acabou de postar, mas... sempre que venho aqui e o assunto é moda, aq tá lotado, será que sumiram pq o assunto é livro? medo.
De qualquer forma, achei super completo o post, e o que você disse, realmente acontece e com muita frequência. Até eu faço isso às vezes... é a simples preguiça de procurar no dicionário e levar uma vida inteira pra ler, por isso prefiro ler as adaptações, pq pelo menos tem o básico do livro anterior. E concordo, existem livros brasileiros ótimos, exemplo de um: A batalha do apocalipse, uahusahusua :3
Adoro o blog, beijos e até!

Ana Ferreira disse...

É, Mayara. Temo que sim, infelizmente.
Fico feliz que tenha gostado da postagem, tentei ser o mais sincera e completa possível, explicando bem esse sentimento preguiçoso que nós temos de vez em quando.
Beeijinhos :*

Rapha disse...

Esse ano só li livros nacionais, foram 06 ao todo, e eu gostei muuito de todos. É claro que sempre tem um ou outro que se destaca, mas não perde NADA pra livros estrangeiros.
E essa coisa do vestibular pedir só clássico é mto triste mesmo!! Tem gente boa e nova por aí que nao tem chance de aparecer, e ainda saem queimados pelos alunos que se traumatizaram ;/