03 abril 2012

Trechos: Lygia Fagundes Telles

Quero ficar só. Gosto muito das pessoas, mas às vezes tenho essa necessidade voraz de me libertar de todos."
Disparadamente minha autora favorita, Lygia Fagundes Telles é paulistana e nasceu a 19 de abril de 1923, quarta filha do casal Durval de Azevedo Fagundes e Maria do Rosário Silva Jardim de Moura. Logo jovem, desenvolveu o interesse pela leitura através das histórias que ouvia entre as rodas de pajens e crianças durante suas viagens em decorrência do trabalho do pai, advogado, que se mudava constantemente para o ofício.

Aos 15 anos, em 1938, publicou seu primeiro livro de contos, chamado Porão e Sobrado. Em 1941, iniciou o curso de Direito na Faculdade do Largo do São Francisco e lá, nas rodas literárias, conheceu nomes como Mário e Oswald de Andrade, Paulo Emílio Sales Gomes, com quem se casaria mais tarde, entre outros. Para garantir seu sustento, colaborava com jornais e trabalhava como assistente do Departamento Agrícola do Estado de São Paulo.

Lygia participou ativamente de protestos contra o Estado Novo e sua ditadura ao lado de artistas como os Andrades, Tarsila do Amaral,  Anita Mafaldi e Heitor Villa-Lobos. Após sua primeira publicação, voltou ao mercado editorial com Praia Viva em 1944 e fortaleceu sua eloquência com o romance Ciranda de Pedra. Consagrou-se verdadeiramente, entretanto, com os famosos Verão no Aquário, Antes do Baile Verde, As Meninas, Seminário de Ratos, A Estrutura da Bolha de Sabão, As Horas Nuas e A Noite Escura e Mais Eu, consecutivamente.

Seu trabalho, no geral, rendeu-lhe muitos prêmios importantes, dos quais destacam-se 3 Jabuti de Melhor Livro do Ano e Ficção; o prêmio Coelho de Neto, concedido pela Academia Brasileira de Letras e o Camões, em 2005, o mais importante da literatura em língua portuguesa.

Fonte: Releituras 

"Quero te dizer que nós, as criaturas humanas, vivemos muito (ou deixamos de viver) em função das imaginações geradas pelo nosso medo. Imaginamos consequências, censuras, sofrimentos que talvez não venham nunca e assim fugimos ao que é mais vital, mais profundo, mais vivo. A verdade, meu querido, é que a vida, o mundo dobra-se sempre às nossas decisões."
(TELLES, Lygia Fagundes - As Meninas - 2009)

"[...] quando na realidade o amor é uma coisa tão simples... Veja-o como uma flor que nasce e morre em seguida porque tem que morrer. Nada de querer guardar a flor dentro de um livro, não existe nada mais triste no mundo do que fingir que há vida, onde a vida acabou."
(TELLES, Lygia Fagundes - Verão no Aquário -  2010)

"A beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da noite, está no crepúsculo, nesse meio tom, nessa incerteza."
(TELLES, Lygia Fagundes - Antes do Baile Verde - 2009)

"Por que não lhe disse antes?
Apertá-lo demoradamente contra o meu peito e dizer: não disse porque pensava que tinha pela frente a eternidade. Só me resta agora esperar que aconteça outra vez, vislumbro esse encontro - mas vou reconhecê-lo? E vou me reconhecer nos farrapos da memória do meu eu?
Peço que me faça um sinal e responderei ao código secreto na mente e no silêncio dos navios que se comunicam quando cruzam no mar."
(TELLES, Lygia Fagundes -  A Disciplina do Amor - 2010)

"A perplexidade do moço diante de certas considerações tão ingênuas, a mesma perplexidade que um dia senti. Depois, com o passar do tempo, a metamorfose na maquinazinha social azeitada pelo hábito de rir sem vontade, de falar sem vontade, de chorar sem vontade, de falar sem vontade, de fazer amor sem vontade... O homem adaptável, ideal. Quanto mais for se apoltronando, mais há de convir aos outros, tão cômodo, tão portátil. Comunicação total, mimetismo: entra numa sala azul, fica azul, numa vermelha, vermelho. Um dia se olha no espelho, de que cor eu sou? Tarde demais para sair pela porta afora."
(TELLES, Lygia Fagundes - Antes do Baile Verde - 2009)

"Com a ponta da língua pude sentir a semente apontando sob a polpa. Varei-a. O sumo ácido inundou-me a boca. Cuspi a semente: assim queria escrever, indo ao âmago do âmago
até atingir a semente resguardada lá no fundo como um feto".
(TELLES, Lygia Fagundes - Antes do Baile Verde - 2009)


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