Uma Crença Silenciosa em Anjos - R.J. Ellory

"1939. Em Augusta Falls, na Geórgia, uma comunidade rural no sul dos Estados Unidos, Joseph Vaughan, de 12 anos, é informado sobre o assassinato de uma colega da escola - o primeiro de uma série de crimes que, ao longo de uma década, vão arruinar as relações entre os habitantes daquela cidadezinha. Joseph e seus amigos estão determinados a proteger o lugar. Para isso, formam um grupo batizado "Os guardiões". Mesmo depois de os crimes terem cessado, uma sombra de mdo e pavor persegue Joseph. O passado parece enterrado, mas, cinquenta anos depois, ele se defronta com o pesadelo que abalou toda sua existência."

Título: Uma Crença Silenciosa em Anjos

Autor: R.J. Ellory

Editora Intrínseca

446 páginas

Nota: 5 de 5 estrelas (Excelente)

   Não consigo me livrar da crença, já aqui citada, de que cada livro tem uma história única além de suas páginas: uma história com todo e qualquer leitor. Faço história com eles desde o momento no qual desejei tê-los, passando pela compra ou pelo presente, indo até suas últimas páginas ou, quem sabe, até uma resenha nostálgica como esta, que me leva de volta à sua leitura triste e às suas páginas embargadas de emoção.

   Esta, caros leitores, é a minha história com "Uma Crença Silenciosa em Anjos", ou, simplesmente, alguns relatos literários sobre o memorável Joseph Vaughan.

   Sempre tive muita vontade de ler este livro. Muita mesmo. Não se deve julgar o conteúdo pela capa, entretanto, além de uma capa extremamente chamativa, triste, com asas manchadas de sangue e fundo preto, o livro tem um título que toca o leitor, que o faz vacilar à espera de uma emocionante história. "Uma Crença Silenciosa em Anjos", como eu quis! Aguardei, pesquisei, cotei... Preços altos, impossibilidades somadas ao espírito consumista feminino... Eis que chega agosto e junto com o mês, a Bienal do Livro de São Paulo (alguém aqui foi?). Eis também que a Intrínseca estava, facilmente, com as melhores promoções dos muitos e muitos estandes do Pavilhão (valeu, Intrínseca!). Eis, poucos dias depois, que eu conheço Joseph Vaughan e lhes digo, prezados blogueiros e leitores, que triste drama! Quantos infortúnios! E tudo começa quando o protagonista era ainda um jovem...

"- E quantos anos você tem, Joseph?

   Sorri.

- Faço doze daqui a cinco dias."

   Anos antes disso, logo no começo, Joseph perde o pai e, mais terrível que pareça, a morte acabará por se revelar ao garoto/rapaz/homem como uma incômoda conhecida.

   Comecemos pela narrativa em primeira pessoa, que merece ser ressaltada por não seguir a ordem cronológica dos fatos. Antepondo o início de alguns capítulos específicos, há fragmentos dos acontecimentos da vida de Joseph no futuro distante dos momentos nos quais a problemática do livro se desenvolve. Enquanto nesta, acompanhamos desde um garoto confuso a um rapaz com triste memórias, naquela, o futuro, em algum momento, encontrar-se-á com as figuras que sofreram os grandes traumas da vida do jovem. O homem que ele se tornou encontra-se com todas as faces necessárias para a sua formação.

   A princípio, lendo a sinopse, não pude desconsiderar a hipótese de que a história talvez abordasse o sobrenatural angelical. Talvez, em algum momento, os anjos viriam e salvariam as vítimas de estupro; as meninas tão cheias de infância, da morte.  Mas o livro, assim como a realidade, é cruel. Não espere pelos anjos: eles não virão. O sangue continuará a jorrar e o tempo todo, em quase todas as páginas, você não poderá deixar de se perguntar quem é o tal assassino. E por quê?

   Primeiro, imagine o quão assustadora é uma notícia, em uma comunidade pequena como Augusta Falls, aonde todos acreditam se conhecer profundamente, de que há um monstro entre eles. Um estuprador, esquartejador e assassino da pior espécie. Imagine que suas vítimas são extremamente jovens, puras e que, de repente, eles talvez não se conhecessem tão bem afinal. Passam a duvidar uns dos outros.

"Sexta-feira, 3 de novembro de 1939, o corpo de Alice Ruth Van Horne foi encontrado. Eu a conhecia melhor do que qualquer um dos meus colegas de sala. Alice tinha olhos verdes, e um cabelo que não era nem louro nem ruivo nem castanho, mas tinha a profusão de tons de mil folhas mortas. Quando ria, parecia uma ave exótica entrando por engano pela nossa janela. Na merendeira, trazia sanduíches que eu sabia terem sido feitos por ela mesma. A casca do pão era cortada."

   Morrem outras. A frequência não é certa. Elas surgem a qualquer hora, em qualquer lugar, embora sejam as mesmas menininhas violadas. Os números, em estatística, não são altos. São suficientes, porém, para abalar toda a estrutura de uma sociedade rural. Não se confia mais nos vizinhos. Os pais de garotas temem por deixá-las irem sozinhas à escola. Começam os toques de recolher.

   Em meio ao medo, surgem Os Guardiões e o ardente desejo de meninos que querem zelar por suas colegas e por Augusta Falls. Em meio ao medo, Joseph desperta para o talento da escrita. Em meio ao medo, promessas se perdem na escuridão da morte. Em meio ao medo, o garoto descobre a relação de sua mãe com o suspeito vizinho alemão, em época de nazistas e Segunda Guerra Mundial. Em meio ao medo, Alex entra de forma especial na vida dele. Em meio ao medo, traumas irreversíveis se fazem presentes como verdadeiros fantasmas. Em meio ao medo, Joseph perde aos poucos a alma de sua mãe e está envenenado pela descrença. Em meio ao medo, ele parte, muda e, ainda partindo e mudando, carrega suas lembranças sofridas. E é em meio a essas lembranças de medo que a oportunidade de encontrar o culpado pelas desgraças múltiplas de sua vida surge. Joseph sabe que não pode deixar passar.

   Estejam prontos para uma história dramática e policial de alto teor emocional. Você está prestes a ser tocado pela injustiça da vida e isso talvez o faça chorar. Está pronto para derramar essas lágrimas?

   Você ainda acredita em anjos?