06 outubro 2012

O Primeiro Dia, de Marc Levy

"- Keira, quando procuramos no infinitamente grande um ponto infinitamente pequeno, uma fonte de luz, por mais afastada, ou quando esperamos um ruído vindo do fundo do universo, de uma única coisa podemos estar certos: da vontade de descobrir."
p. 259
A curiosidade é um bem (ou mal) próprio do ser humano. Em nome de questionamentos e da incansável busca pelo saber, colocamo-nos diante de grandes desafios e incertezas atrás de respostas. Como enuncia aquela propaganda muito popular na televisão, contudo: são as perguntas que movem o mundo. E os  protagonistas de O Primeiro Dia são uma ideal representação da teoria: Adrian, um astrofísico, e Keira, uma arqueóloga, vivem em função de duas interrogações discrepantes que, futuramente, podem se mostrar complementares. Para ele, onde começa a aurora? Para ela, quando teria surgido, de fato, o primeiro ancestral humano?

Já havia lido algumas resenhas sobre obras de Marc Levy que me deixaram bastante curiosa. Este livro, na verdade, foi o meu primeiro contato real com o texto do autor e, indo diretamente ao ponto, não acredito que poderia ter sido melhor. Dono de uma narrativa ágil, inteligente e repleta de questionamentos sobre a ciência, a vida e os sentimentos humanos, Levy nos instiga a todo o tempo com a narração em primeira pessoa, a qual oscila entre os dois protagonistas até o momento crucial da história em que se encontram.

É difícil contextualizar a temática por completo sem estragar, ainda que pouco, o conjunto de surpresas que esperam pelo leitor em O Primeiro Dia. Começamos com Adrian, um homem das ciências, solitário e que acredita estar vivendo os melhores momentos de sua vida na altitude e na pureza atmosférica das montanhas do Atacama, no Chile, realizando pesquisas astronômicas para uma universidade londrina. Até o momento em que, por um triste imprevisto, vê-se obrigado a voltar à sua pequena casa na Inglaterra. Do outro lado do mundo está Keira, arqueóloga apaixonada, ferrenha defensora de sua liberdade como mulher, terrivelmente sincera, à frente de uma expedição no Vale do Omo, Etiópia. Contudo, também ela se vê forçada ao deixar seu trabalho em nome de uma tempestade de areia que arrasou com todo o sítio arqueológico construído até então e com qualquer possibilidade de dinheiro adicional. Desencantada com a vida, é para Paris que volta ao encontro de sua irmã.

Daí, por capricho da natureza ou meramente pelo acaso, as duas personagens se encontram num concurso de teses científicas e têm, a partir daquele momento, suas vidas e suas perguntas atreladas de maneira intensa, apaixonada e incontestável.

Apesar do breve resumo, há muito que ler neste livro de Marc Levy. Com uma sinopse despretensiosa e algumas perguntas ao fim que fazem a imaginação do leitor vagar pelos extremos da literatura, há um grande senso de observação e riqueza contidos em O Primeiro Dia. O elenco das personagens é um exemplo: Keira, com sua sinceridade exagerada, torna-se logo a alma da história, sempre dando respostas irônicas e cruéis - verdadeiras, sobretudo -, de tanto que já viu da humanidade ao viajar pelo mundo e chegar ao coração da África. Adrian já é mais emoção, aquele velho amigo bonitão, calmo, quieto e extremamente inteligente, sempre ávido por uma nova descoberta, repentinamente tomado pelo gosto de uma antiga-nova-paixão. Saindo da zona de conforto dos protagonistas, podemos citar Ivory, um professor aposentado de grande renome e sabedoria que entra na vida dos protagonistas tão inesperadamente quanto qualquer outro acontecimento no livro, alterando o rumo das coisas de maneira sutil e necessária. São diferentes histórias que giram em torno do núcleo principal. Cada uma curiosa à sua maneira, imprescindível.

Com uma rede de mistérios bem intrincada, renovando o interesse do leitor a cada nova página; uma narração fluente e rica em detalhes, sem muitos floreios, entretanto; uma descrição privilegiada sobre as belezas da França, Inglaterra, Etiópia, Chile e China; e uma narrativa que mistura um pouco de cada gênero, constitui-se aqui um grande livro, um excelente entretenimento e uma obra repleta de saber. Saber sobre a ciência, sobre a antiguidade, sobre o mundo e, simplesmente, sobre os mais sinceros sentimentos humanos.

Informações técnicas
Título: O Primeiro Dia
Título original: Le Premier Jour
Autor: Marc Levy
Tradução de: Jorge Bastos
Editora: Suma de Letras (cedido em parceria)
Número de páginas: 367
ISBN: 978-85-8105-098-0
Gênero: Ficção francesa
Continua com: A Primeira Noite

Marc Levy nasceu em 16 de outubro de 1961, na França. Empresário de sucesso nos ramos de computação gráfica e arquitetura, aos 37 anos teve a ideia de escrever uma história, com o intuito único de que seu filho a lesse quando chegasse à idade adulta. O livro resultante, E se fosse verdade?, de 1999, foi um grande sucesso, lançando sua carreira de escritor. Hoje, com mais de 26 milhões de livros vendidos em todo o mundo, ele é publicado em 45 línguas. Em 2005, estreou em todo o mundo a adaptação cinematográfica de E se fosse verdade?, com Reese Witherspoon e Mark Ruffalo.


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