07 janeiro 2013

A Trama do Casamento, de Jeffrey Eugenides

Ganhei A Trama do Casamento no ano passado, dia dos namorados, sem ter namorado, no entanto. Numa dessas promoções que as editoras promovem, e todos nós adoramos  - a Companhia das Letras, neste caso -, acabei levando para casa um livro que rendeu muitos elogios da crítica literária e foi tudo, menos aquilo pelo que eu estava esperando. Uma observação que, todavia, deve ser vista de uma perspectiva positiva, pois Jeffrey Eugenides, também autor de As Virgens Suicidas, é, sem sombra de dúvida, talentoso e arrojado.

Lembrando um pouco a atmosfera em que são ambientados livros como Resposta Certa e Um Dia, A Trama do Casamento aborda um complicado contexto romântico, em meio ao período universitário dos anos 80 e, mais temido que ele, aquilo que o sucede, a vida adulta, nua e crua. Como protagonista, temos Madeleine Hanna, uma jovem bonita e apaixonada por literatura vitoriana, também capaz de gerar muitas paixões. Entre os longos períodos de solteirice e curtição, então, a moça conhece Leonard Bankhead, seu companheiro de turma nas aulas de Semiótica, uma espécie de gênio descompromissado, ligado às áreas biológicas e que faz um grande sucesso entre as outras garotas. Paralelamente a essa relação chamativa que passa a existir entre os dois, dada a beleza, a inteligência e a popularidade de ambos, há Mitchell Grammaticus, igualmente genial, um estudante de teologia que acredita seriamente num futuro em que ele e Maddie serão casados.

Leviano é pensar, contudo, que o livro seja basicamente um romance no qual há o espectro de um triângulo amoroso. Muito mais que isso, Jeffrey Eugenides oferece ao seu leitor uma obra repleta de metalinguagem em que a visão feminista de mundo passa a pegar força, acompanhada dos pensamentos revolucionários e liberais dos anos 80. Através de uma narrativa bem desenvolvida e inteligente, temos um retrato do mundo particular de três jovens que convergem ao mesmo centro, de recém-formados que seguem caminhos diferentes pela vida, loucos para dar forma à perturbadora intelectualidade da qual são dotados.
"Tudo bem que Tolstói ficou meio exagerado, perto do fim. Rejeitando Anna Kariênina. Mas quantos escritores se rebelaram contra o próprio gênio? Talvez fosse a obsessão de Tolstói pela verdade que fizesse ele ser tão grande, para começo de conversa. O fato de ele estar disposto a desistir da sua arte era o que fazia ele ser um grande artista."
p. 112
Inteligência e intelectualidade, a propósito, são duas palavras de ordem ao longo de todo o livro, refletindo os ânimos efervescentes do período acadêmico e tornando A Trama do Casamento uma história rica em intertextualidades, com destaque para as literárias. Fala-se aqui de Jane Austen, das irmãs Brontë, Tolstói (vide trecho selecionado acima), Umberto Eco e Hemingway, por exemplo, sempre acompanhados de comparações e teorias interessantes na qual, mais uma vez, reina a abordagem vanguardista de um período em que o mundo passava por grandes mudanças culturais.

Ainda assim, após acompanhar páginas e mais páginas a respeito dos três jovens, numa narração dividida em partes nas quais cada um era retratado de maneira íntima - oportunidade de dar maior imparcialidade à visão do leitor -, cheguei à conclusão de que o maior trunfo de toda a obra são as suas personagens. Madeleine, com todas as dúvidas, decisões precipitadas e inseguranças quanta à monografia, ao namoro e ao casamento; além do ideal feminista em ascensão. Isso tudo acompanhado da inspiração pelas escritoras do Período Vitoriano, mulheres pródigas intelectualmente em meio a uma sociedade repleta de preconceitos. Leonard e sua genialidade perturbadora, tiques, manias e os fantasmas vigilantes do passado. Mitchell, por fim, ainda mais genial, espiritual e cativante à sua excêntrica maneira.

Ademais, não costumo mencionar o trabalho dos tradutores em minhas resenhas, mas creio que este livro mereça a sua atenção, tamanho o cuidado que Caetano Galindo visivelmente teve ao trazer as palavras de Eugenides, sobre a juventude, para um vocabulário mais próximo da realidade brasileira. Sem traduções literais de forma demasiada - que costumam soar forçadas - e mesclando bem os períodos inteligentes com as gírias da época. Não é à toa que também o trabalho de traduzir Ulisses, aquele livro enorme de James Joyce sobre o qual já falamos por aqui, tenha ficado a cargo de Galindo.

A Trama do Casamento, ao fim, trazendo frustrações comuns ao longo da vida, relacionamentos complicados, sonhos, escolhas e desilusões, é um daqueles livros que faz jus a todo o seu renome sem a necessidade de ser excepcional, embora seja, ainda assim, uma boa escolha para ativar a vida literária em 2013. E começá-la com o pé direito, a propósito.

Informações técnicas
Título: A Trama do Casamento
Título original: The Marriage Plot
Autor: Jeffrey Eugenides
Tradução de: Caetano W. Galindo
Editora: Companhia das Letras
Número de páginas: 438
ISBN: 978-85-359-2088-8
Gênero: Ficção norte-americana

Jeffrey Eugenides nasceu em Detroit, nos Estados Unidos, em 1960. Desde 1993, com o lançamento de As virgens suicidas - posteriormente adaptado ao cinema por Sofia Coppola -, é um dos escritores mais aclamados de sua geração. Muito aguardado, seu segundo livro,Middlesex, foi lançado em 2002 e recebeu o prêmio Pulitzer de melhor romance do ano.A trama do casamento é seu terceiro romance.

Boa semana a todos!


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