23 março 2013

A Filha da Feiticeira, de Paula Brackston

Acho difícil, em minha experiência pessoal como leitora, iniciar a leitura de um romance sem expectativas, sejam elas otimistas ou pessimistas. Quase impossível, até. Quando me surgiu este A Filha da Feiticeira, no entanto, poucos comentários havia lido a seu respeito, além de me lembrar apenas vagamente da história que ele traria, de acordo com a sinopse. E eis que, em meio a páginas e mais páginas, viajando por algo próximo de quatro séculos num mundo onde bruxas existem, mal me importei com a passagem das horas, apenas querendo saber quais fins levariam esta trama que tanto se destrincha pelo passado de sua heroína.

Num contexto bastante simplificado, sem as muitas divagações explicativas que o enredo merece, o livro de Paula Brackston narra a história da longa existência da feiticeira Elizabeth Anne Hawksmith, de 384 anos, imortalizada por uma maldição que a persegue. Ou por um vilão amaldiçoado, assim digamos, Gideon Masters, mago perigoso que a iniciou no mundo da bruxaria. Tal realidade de fugitiva e o seu envelhecimento tardio, então, fazem com que ela viva em constante mudança, evitando ao máximo o contato com outros seres humanos em nome de sua condição "especial", apenas vendendo seus óleos e poções naturais para o próprio sustento.

Quando num povoado da Inglaterra, contudo, Elizabeth conhece a jovem Tegan, nasce daí uma curiosa amizade entre as duas que faz com que a bruxa queira iniciar a garota no mundo da magia e dos feitiços, de forma a compartilhar seus maravilhosos e também cruéis segredos. Há em meio à euforia, porém, o medo sempre presente de que Gideon reapareça para reclamá-la e acabe fazendo algum mal a sua aprendiz, pois ele, de forma que o leitor logo nota, sempre estará por perto.

Ainda que a problemática da obra se resuma basicamente deste modo, é inegável que a riqueza de A Filha da Feiticeira está contida, na verdade, nos grandes relatos que a protagonista faz de sua vida ao longo dos séculos de existência, iniciados pela perseguição às bruxas na Europa, seguidos por uma Londres em ascensão industrial e finalizados próximos aos tempos de Segunda Guerra. Com uma cronologia psicológica, neste caso, conhecemos as muitas personalidades que Elizabeth assumiu enquanto fingia ser alguém e, principalmente, quem ela foi em sua essência humana antes de todo o caos da vida: apenas Bess, uma jovem simples, que amava a família e viu a desgraça chegar ao seu lar acompanhada da peste que dizimou populações europeias.

É inegável, por exemplo, que a realidade wicca da protagonista foi bem abordada pela autora, contando com várias descrições de rituais à Deusa e às criaturas da floresta. Não se deve esperar, entretanto, por grande relevância histórica, uma vez que o livro tem como um de seus gêneros principais a fantasia e assume, assim, a função de narrar um romance fictício, com mero cenário histórico (beirando o nonsense) que se estende ao mundo sobrenatural da bruxaria e envolve o leitor desavisado.

Envolvente, aliás, é um bom adjetivo para classificar o livro, de forma geral. Com uma narração simples, mas bem coordenada, Paula Brackston cria uma heroína simpática e também cheia de defeitos: Elizabeth é desconfiada, meio ranzinza e oscila frequentemente entre a sagacidade de quem já esteve vagando por séculos e a inocência daquela menina que confiou certa vez num homem cruel. Diria também que é um romance intenso, com uma boa dose de sentimentos responsáveis por nos deixar à flor da pele, além de uma sensualidade comum em livros sobre bruxas que não sejam juvenis, como é o caso.

A Filha da Feiticeira, por fim, cumpre bem sua função de entreter e, mais que isso, de se aproximar de seu leitor por meio de uma história interessante que se divide em muitas épocas, muitos amores e várias outras pequenas histórias. Cada uma especial à sua maneira.

Ps.: Estava tão envolvida com a leitura que esqueci de marcar citações. Uma pena...


Informações técnicas

Título: A Filha da Feiticeira
Título original: The Witch's Daughter
Autora: Paula Brackston 
Tradução de: Fal Azevedo
Editora: Bertrand Brasil (exemplar cedido como cortesia)
Número de páginas: 443
ISBN: 978-85-286-1632-3
Gênero: Romance inglês


Paula Brackston vive nas florestas do País de Gales e é formada em escrita criativa pela Universidade de Lancaster, Inglaterra.  Em 2007, foi finalista do prêmio Crème de la Crime para novos autores. 
Em 2010, seu livro Nutters (escrito sob o pseudônimo de P. J. Davy) foi finalista do Mind Book Award. A Filha da Feiticeira é sua estreia no Brasil.


0 comentários: