04 fevereiro 2012

Budapeste, de Chico Buarque

Resenha da semana é uma coluna na qual Ana dá sua opinião a respeito do livro lido no momento, com direito a trechos e informações completas sobre a obra e o autor. Postada aos sábados.
Título: Budapeste
Autora: Chico Buarque
Editora: Companhia das Letras
Número de páginas: 174
Edição: São Paulo 2003
ISBN: 85-359-0417-4
Gênero: Literatura brasileira; Romance

"O Danúbio, pensei, era o Danúbio mas não era azul, era amarelo, a cidade toda era amarela, os telhados, o asfalto, os parques, engraçado isso, uma cidade toda amarela, eu pensava que Budapeste fosse cinzenta, mas Budapeste era amarela."
Chico Buarque é extremamente popular no meio da música brasileira e o leitor, ao se deparar com um livro seu, normalmente o associa a composições poéticas, belas e sentimentais. Incluo-me nesta categoria, pois esperava algo totalmente distinto da leitura de Budapeste.


Conhecemos aqui a história de José Costa, um ghost-writer brilhante frustrado com a vida e sua carreira de anonimato.Vive no Rio de Janeiro com sua mulher Vanda e, por acaso, num convite a comparecer a uma assembleia de "autores anônimos" em Istambul, vai dar em Budapeste na volta para casa e acaba se encantando com o lugar, com a língua húngara e com tudo que aquele distinto universo, tão frio, cinzento e distante lhe oferece.

De volta ao Rio, não poderia imaginar que logo retornaria à cidade húngara. Tudo em sua volta o incomoda. Embora os negócios na agência de escrita estejam indo bem, começam a surgir novos funcionários que imitam com perfeição sua escrita, arrancando-lhe o estilo, a criatividade e o amor-próprio. Ademais, em meio a uma crise no casamento, Costa se dirige a Budapeste e lá conhece Kriska, a mulher da pele alva e das palavras complicadas que promete lhe ensinar húngaro e pela qual ele logo se apaixona.

Em poucas palavras, diria que Budapeste é um livro confuso, que contém suas melhores sacadas nas entrelinhas. Há toda uma analogia desde o conteúdo visual e textual da capa e da parte posterior do livro. A história, no geral, é fluida. As palavras de Chico Buarque são agradáveis, bem ritmadas, gostosas de serem lidas, um palavreado tipicamente brasileiro, que mistura inteligentemente o chulo e o culto em uma mesma frase.
"Então tentei as palavras mais inesperadas, neologismos, arcaísmos, um puta que o pariu sem mais nem menos, metáforas geniais que me ocorriam de improviso, e o que mais concebesse já se achava ali impresso sob as minhas mãos. Era aflitivo, era como ter um interlocutor que não parasse de tirar palavras da minha boca, era uma agonia. Era ter um plagiário que me antecedesse, ter um espião dentro do crânio, um vazamento na imaginação."
A narrativa está repleta de paradoxos. As constantes idas e vindas de Costa, do Rio a Budapeste, de Vanda a Kriska, de português a húngaro mostram a oscilação integral de seu temperamento. Enquanto no Brasil é sua vida real, de José Costa, que o espera, a frustração, o anonimato e um relacionamento de tempos; na Hungria há um idioma dito demoníaco que o convida a ser Zsoze Kósta e que o dá liberdade para escrever sem estar à sombra de outros, ventos libertadores e uma paixão que queima, gelada. Há o calor escaldante, sufocador, e o frio que recolhe.

Temos aqui o protagonista que é o típico anti-herói: não causa simpatia, é fraco, covarde, ciumento, confuso e introspectivo, com ares de Bentinho em Dom Casmurro, inclusive com tendências a bipolaridade, arriscaria dizer.

Budapeste foi uma história que não me cativou, com seu certo charme, mas que acompanhei de longe, do enredo e de todas as suas personagens, apáticas, meras ilustrações e frutos do momento. No mais, o maior envolvimento foi com o questionamento do alter-ego de escritor de Costa, responsável por conferir certa genialidade descompromissada à obra, e que garante uma leitura interessante para os que apreciam literatura brasileira. É também um título muito complicado para se dialogar sobre, tendo em vista sua amplitude interpretativa, que deixo a cargo de cada um por ora.

Avaliação Geral:
Nota 3 de 5 (Bom)

Um bom sábado a todos!

0 comentários: