19 novembro 2012

Minúcias


De tanto querer grandiosidade, acabou se encantando com os pequenos detalhes. Um sorriso daqui, uma bonita palavra dita dali. Leu minúcias no dicionário e chegou à conclusão de que a vida era um longo caminho, daqueles bem minuciosos.

Olhou para o lado e encontrou prazer nas coisas mais simples, naquelas em que raramente se repara. Gostou da cor da parede da casa, achou que o sol brilhou com mais intensidade numa manhã de primavera. Indo ao mercado, viu que as verduras estavam quase que livres de machucados, como as donas nas feiras gostavam de dizer. Ficou gripado e tomou mel com limão suspirando, debaixo das cobertas.  Acordou num belo dia e se deu conta, de uma maneira estranha e reconfortante, que viver era simples.

O homem, querendo tanto ser empreendedor e avançado e rico e melhor e maior, esqueceu-se do prazer das coisas pequenas. Dos sabores e dos dissabores, dos amores e dos desamores. Não daqueles eternos e trágicos, como em Romeu e Julieta, mas daqueles meio passageiros. Aqueles amores vividos em um segundo, numa troca de olhares carregada de sentimento. Aqueles sabores picantes e instantâneos que confundem o paladar. Aqueles desamores afogados num copo de bar.

Deixou de pensar no fim para apreciar cada estágio. As brincadeiras da infância, as descobertas da juventude, as responsabilidades da vida adulta, as reflexões da velhice. Parou de se queixar dos problemas e curtiu a fossa de uma desilusão amorosa ouvindo música romântica mexicana. Em vez de reclamar do som alto do vizinho, começou a apreciar os ritmos de pegada popular. Não xingou no trânsito como o teria feito em outros dias, todavia, apenas acenou ao motorista ao lado e desejou um bom dia, passar bem. Ao rapaz que sorria, poderia ter dito não. Mas disse sim. Sim a ele, sim à vida, sim à felicidade das coisas pequenas.

Sonhando tanto com férias na Europa, emprego perfeito em Montreal, casamento na igreja com altar de ouro, família ideal, ser o número um na lista de aprovados, acabou esquecendo-se de sonhar enquanto dormia. Sonhar com coisas que nem sequer existem, que a paixão esquecida ainda vive, que o passado, há tanto tempo abandonado, persiste em outra dimensão. Sonhar acordado, com sorvete de pistache, com beijo com gosto de bala de morango, com chuva de verão enquanto a gente se abraça no meio da rua.

São os detalhes, as minúcias e particularidades que compõem a grandeza. O homem, tão preocupado em chegar ao topo, esqueceu-se de viver cada degrau da escada. O homem, triste e grandioso, saiu num belo dia à caça da felicidade e não a viu esperar discretamente, pura e simplória, numa esquina dessas da vida.

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