31 março 2013

Até onde vai a parcialidade de quem "resenha"

Imagem: We Heart It/ Racheluminous Tumblr
Depois de muito tempo, volto com um tímido texto da coluna Destaque do Mês, que coloca algum tema polêmico relativo à blogosfera ou à literatura em pauta.
Em meio à blogosfera literária, muitos "resenhistas" se utilizam da bandeira da sinceridade para alegar que são imparciais, à medida que o gênero redacional permite tal postura. É sabido, no entanto, que, como texto opinativo até mesmo em sua base científica, a resenha possibilita o surgimento de opiniões extremas e, arrisco dizer, infundamentadas; abrindo espaço para que muitos autores equivocados surjam sob o novo estigma pop de "resenhistas".

Buscando embasamento teórico¹, a princípio, conclui-se que a resenha crítica (da qual somos adeptos) é um tipo textual que apresenta, em seu conteúdo, uma síntese da história lida, aprofundamento analítico em algum fragmento que tenha se destacado de toda a obra - de acordo com a visão do autor - e um julgamento referente ao conteúdo, norteando-se pela análise já realizada no decorrer do desenvolvimento da opinião. Tal qual uma crônica ou uma dissertação argumentativa, por exemplo, a resenha se dá através de um método próprio, com base num modelo amplamente utilizado de forma a lhe conferir identidade, e requer, desta maneira, que tenha alguns padrões, independentemente dos estilos pessoais ou vanguardistas que são acrescidos a ela por cada escritor em sua particularidade. Isto não significa, todavia, que redigir algo como "adorei demais o livro", após um mínimo resumo, torne um texto corrido em uma resenha.

Atribuir juízos exagerados ou demasiadamente pessoais a um livro, como blogueiro literário, gera no leitor uma falsa ilusão de que a obra será, fatalmente, da forma que o autor a descreve. Ainda pior, por outro lado, é perder a credibilidade por gerar opiniões extremistas e injustificadas. Tomemos como exemplo hipotético um "resenhista" conhecido que fala sobre "Dom Casmurro", de Machado de Assis e diz que o livro é ruim, alegando o fato de Bentinho se tratar de uma personagem irritante e Capitu, de uma adúltera, sem justificar os motivos que o levaram a tais conclusões. É natural que, neste caso, os leitores que já conheçam a obra não sejam realmente influenciados pelos comentários. Não de forma a mudarem suas impressões de leitura, claro. Os que a desconheciam até então, contudo, passarão a ter como base uma opinião de absoluta parcialidade que, abstendo-se de parâmetros críticos fundamentados, considera-se resenha com muito orgulho, sim, senhor.

Não é como se o resenhista, em sua função de leitor antes de crítico (ou ambos simultaneamente), não possa odiar, amar, gostar "assim, assim" ou ficar indiferente a um livro. É claro que pode! Cabe a ele, todavia, analisar a obra, acima de todas as coisas. Pois é inegável que para odiar, amar, gostar "assim, assim" ou ficar indiferente a um livro há toda uma população de leitores. E é tão simples atribuir um sentimento ao final de um texto para publicá-lo posteriormente como resenha que, ultimamente, em tempos de saturação de blogosfera, a gente fica até surpreso com algumas que seguem o gênero redacional ao pé da letra, falando de grosso modo e sem generalizar, que fique claro.

Outro fator que visivelmente - e infelizmente - influencia muito na parcialidade de um resenhista é a parceria com as editoras. Ao receber um livro "de graça" (com o perdão pela redundância, mas o emprego foi necessário para fortalecer o conceito), alguns dos críticos e potenciais formadores de opinião passam a pensar duas vezes antes de soltar o verbo em cima de uma obra que, às vezes, não é tão boa quanto a mídia editorial veicula. Na troca de favores, fica a crença e o medo de muitos autores de que divulgar algo ruim a respeito de um produto daquela empresa corrompa os benefícios da parceria (lê-se encher a estante sem gastar). As opiniões pouco sinceras, assim, quase que virais, se propagam e iludem novamente os leitores que depositam sua confiança naquele blogueiro específico. Pois venhamos e convenhamos, atribuir a si mesmo o título de "resenhista", ultimamente, é mais que fácil, é mainstream.

Semelhante a um juiz - analogia forte, mas exemplificada adiante -, cabe ao autor de resenhas escrever um julgamento adequado, fortalecido por argumentos e, principalmente, por análise do livro, ainda que esta se baseie em fragmentos aparentemente insignificantes dele. Sem ser tendencioso ou motivado por questões de próprio interesse, espera-se que o "resenhista" não busque a imparcialidade (textos opinativos são fatalmente parciais), como também tenha o discernimento necessário para ser franco e impor seu ponto de vista parcial, mas justificado daquela maneira da qual apenas os bons "resenhistas", ou os que os são de fato, sabem fazer uso.

¹ Base teórica: Resenha: o que é e como se faz - FERREIRA, A. B. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1996.

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