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07 abril 2013

Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago

"O medo cega, disse a rapariga dos óculos escuros, São palavras certas, já éramos cegos no momento em que cegamos, o medo nos cegou, o medo nos fará continuar cegos." (p. 131)
Ao falar sobre livros de "impacto", desenvolvi um hábito de caracterizá-los com o adjetivo "visceral", ainda que nem todos o sejam no sentido mais literal da palavra. Quando concluí a leitura deste romance de José Saramago, no entanto, creio que nenhum outro vocábulo seria tão adequado para descrevê-lo. Simplesmente porque, da primeira linha ao último ponto, Ensaio sobre a Cegueira é duro, cruel, angustiante e, mais que qualquer outra coisa, visceral. 

Através de uma narrativa em que as personagens não têm nome e nem tampouco as falas são marcadas por travessões ou aspas (uma característica típica do autor que reflete a angústia de suas obras), tem-se aqui um mundo em que todos, subitamente, um a um, são assolados pela cegueira. Não a cegueira comum, a qual já conhecemos, mas outra que se dá por uma verdadeira pandemia, que chega aparentemente sem motivo e turva a visão de quem antes costumava ver tão bem. Uma cegueira branca, leitosa e repentina que causa caos e deixa os instintos primitivos da humanidade à flor da pele.

Mais terríveis que o próprio fato de se estar cego, em Ensaio sobre a Cegueira, todavia, são as consequências que a condição traz, levando o leitor a realizar diversas reflexões. Como único escritor em língua portuguesa que venceu o Nobel de Literatura, Saramago desnuda com destreza a alma humana e suas entranhas, o que elas têm de melhor e, com enfoque notável, de pior.

02 março 2013

Elogio da Madrasta, de Mario Vargas Llosa

Fala-se muito em literatura erótica atualmente. É visível, no entanto, que há classificações bastante especulativas por parte dos leitores em se tratando do limiar entre o erotismo e o pornô, no sentido mais puro - adjetivo contraditório - da palavra.

Neste romance de Mario Vargas Llosa, peruano vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 2010 (um dos únicos sul-americanos a conquista esta façanha, ao lado de Gabriel García Márquez), quem impera é o erotismo. Isto porque Elogio da Madrasta narra a história de Lucrecia, uma mulher que, aos 40 anos de idade, esbelta e plena em sua vida sexual ao lado do marido, Don Rigoberto, acaba se envolvendo de maneira leviana com Fonchito, de quem é madrasta, um garoto que mal entrou na adolescência e já nutre verdadeiro fascínio por ela. 

O que aparentemente poderia se encaminhar para uma narrativa dramática e de forte teor, todavia, acaba ganhando certa leveza e até mesmo alguns toques peculiares de humor característicos de Vargas Llosa. Sem abrir mão da sensualidade, claro, que é o principal elemento na formação estilística do livro. 
"Também foram abolidos os sentimentos altruístas, a metafísica e a história, o raciocínio neutro, os impulsos e obras de bem, a solidariedade com a espécie, o idealismo cívico, a simpatia pelo congênere; foram apagados todos os humanos exceto você e eu. Desapareceu tudo o que poderia nos distrair ou nos empobrecer na hora do egoísmo supremo que é a hora do amor. Aqui, nada nos freia nem nos inibe [...]"
p. 145

15 maio 2012

Compreendendo o Nobel de Literatura

José Saramago recebendo o Nobel de Literatura em Estocolmo, Suécia, a 1998

Como todos os outros segmentos artísticos, a Literatura conta com diversas premiações aos mais talentosos autores, que variam desde gênero a público-alvo, de país para país, estado para estado, com muitas influências daquilo que os leitores esperam de uma obra literária, no geral.

Entre os grandiosos da área, encontra-se sob maior prestígio o Nobel de Literatura que, muito pouco coincidentemente, premia escritores com propostas e estilos que atinjam o público mundial de maneira distinta, sob os padrões da década estabelecidos pela Instituição, totalmente contrários às tendências comerciais que surgem entre os renomados best-sellers.

Idealizado por Alfred Nobel, o prêmio surgiu no início do século XX, em 1901 e, anualmente, desde então, seleciona um autor que tenha produzido o melhor e mais magnifico conjunto que inclui, num apanhado geral, sua obra inteira, seus principais livros - e não um título isolado, como muitos pensam -, mentalidade, estilo e filosofias. A decisão cabe à Academia Sueca, que a anuncia em outubro ao mundo.

"Cem Sonetos de Amor", de Pablo Neruda, autor
 vencedor do Nobel de Literatura em 1971.
No hall de autores contemplados, encontram-se personalidades como Bertrand Russel (1950), Winston Churchill (1953), Ernest Hemingway (1954), Albert Camus (1957), Jean-Paul Sartre (1964), Pablo Neruda (1971), Gabriel García Márquez (1982), José Saramago (1998) e Mario Vargas Llosa (2009): representantes notáveis de diferentes gêneros, cada um merecedor do prêmio à sua maneira. Há, entretanto, controvérsias sobre algumas escolhas da Academia, que deixou de selecionar grandes prodígios da arte como James Joyce, Vladimir Nabokov e, mais no início do século, o próprio Leo Tolstói e também Émile Zola.

Os critérios para a seleção, além daqueles vigentes em todos os concursos e contemplações da mesma categoria - como o emprego da norma culta e o adequamento da obra ao contexto semântico -, seguem um certo padrão de favoritismo por décadas, num gênero que condiga com a situação pela qual o mundo passa, tanto historicamente, quanto a seus ideais e esperanças. Passeando pelo site oficial do Prêmio Nobel, Nobelprize.org, encontrei uma relação em inglês que apresenta ao leitor espécies de escolas literárias segmentadas pelos próprios idealizadores, referentes ao trabalho dos autores vencedores de cada época, as quais traduzo parcialmente abaixo.

"Um majestoso e sonoro idealismo" (1901-1912)
Alguns autores: Theodor Mommsen, Frédéric Mistral e Selma Lagerlöf (primeira mulher contemplada)
Os vencedores desta época tinham como característica principal um idealismo utópico na composição de seus textos cheios de pompa e livres de críticas negativas de caráter socioeconômico. Apresentavam a família como instituição máter e a igreja como órgão sagrado. Neste mesmo momento Zola e Tolstói foram negados por apresentarem ideais tão diferentes e realistas, impregnados de retratos verdadeiros de suas sociedades.

Uma política de neutralidade (1ª Guerra Mundial)
Alguns autores: Verner von Heidenstam e Henrik Pontoppidan
Momento em que autores de países menores, como a Suécia e a Dinamarca tiveram sua chance de brilhar no prêmio, tendo em vista os tantos problemas que rondavam os gigantes da Europa em nome da guerra. Não muito idealista, mas ainda pouco engajado por uma questão repressora e de medo entre o povo,

"O grande estilo" (anos 20)
Alguns autores: Jacinto Benavente, George Bernard Shaw e Thomas Mann
O estilo clássico passa a não ser o principal paradigma de garantia ao prêmio. A Academia Sueca compreende uma nova literatura e a dá abertura a uma corrente mais contemporânea, preocupada com os agravantes sociais.

"Interesse universal" (anos 30)
Alguns autores: Sinclair Lewis, Ivan Bunin e Eugene O'Neil
O prêmio Nobel, nos anos 30, volta-se mais àquilo que a população interessada em cultura, no geral, quer ler. O destaque aqui fica com a prosa, salvo raras exceções em que a obra poética a supera.

Os pioneiros (1946-)
Alguns autores: T.S. Eliot, William Faulkner e Bertrand Russel
Após uma pausa na premiação do Nobel de Literatura em nome da 2ª Guerra Mundial, o cenário dos livros precisava ser renovado novamente. Estabelece-se aqui, de uma vez por todas, um estilo mais contemporâneo, ligado aos interesses da população e também refinado, com traços bem marcantes.

"Cem Anos de Solidão", de
Gabriel García Márquez, vencedor
do Nobel em 1982, considerado uma
revelação no âmbito literário.
Atenção a mestres desconhecidos (1978-)
Alguns autores: Elias Canetti e Gabriel García Márquez
Decide-se aqui dar mais atenção a autores desconhecidos que deveriam ser conhecidos por todo o mundo com suas grandes obras, como García Márquez, que uma vez revelado, tornou-se um dos principais autores ibero-americanos.

"A literatura de todo o mundo" (1986-)
Alguns autores: Octavio Paz, Toni Morrison, José Saramago e V.S. Naipaul
Com mais uma necessidade de mudança, o Nobel finalmente tem a sua maior abertura para uma Literatura composta por autores de diversas nacionalidades. Um período no qual não há, exatamente, uma predominância europeia e surgem autores da África do Sul, México, China e Japão, por exemplo, além de, um fato de suma importância para nós, ter sido contemplado o primeiro autor representante da língua portuguesa, José Saramago.

Dando uma atenção maior ao nome dos autores, os leitores provavelmente estranharão grande parte deles pois, por mais popular que seja o Nobel de Literatura, muitas das obras sequer chegam a ser publicadas no Brasil, por sua demanda baixa em termos comerciais, sendo uma equivalência ao cinema de arte, sirva de exemplo, bem menos lucrativo que a indústria tecnológica de Hollywood, como os clássicos (antigos e contemporâneos) para os best-sellers de linguagem fácil e puro entretenimento.

Aos que eventualmente se interessarem, deixo a dica de conhecer a coleção que está sendo lançada neste ano pela Folha de São Paulo de Literatura Ibero-americana, com ilustres obras de autores da América Latina premiados mundialmente, como Mario Vargas Llosa, recente vencedor do Nobel de Literatura. Os livros estão saindo a um valor de R$16,90 e a compra pode ser feita pelo próprio site, podendo levar até 30 dias para chegar, com frete de R$2,00, por exemplo, para a região do interior de São Paulo. A cada semana uma nova obra estará à venda nas bancas, até o mês de setembro. Mais AQUI

Fontes:
NobelPrize.org
Nobel de Literatura - Wikipédia
Exame.com - 10 livros de vencedores do Nobel de Literatura que você deveria ler