19 maio 2012

Por Isso A Gente Acabou, de Daniel Handler

"Estou contando por que a gente acabou, Ed. Estou escrevendo, nesta carta, toda a verdade sobre o que aconteceu. E a verdade é que, porra, eu te amei demais."
Daniel Handler talvez não seja um nome tão famoso entre o ramo literário, mas Lemony Snicket, o autor das Desventuras em Série certamente o é e, que fique claro desde o início, os dois tratam-se de pseudônimos da mesma pessoa, uma mente brilhante que escreve com drama e realismo de uma maneira singular.

Com muita disparidade da série infanto-juvenil de 13 volumes sobre os três irmãos Baudelaire, Por Isso A Gente Acabou é um romance inigualável a tantos que já li na vida, senão a todos, tão peculiar sua narrativa e a forma como o amor adolescente se desenvolve nele. Aqueles que talvez tiverem julgado Desventuras em Série como infantil demais, vão se surpreender com a nova faceta apresentada neste livro voltado a um público jovem-adulto, mais maduro e preparado para cada estágio das paixões que nascem em corações de garotos e garotas de 15, 16, 17, 18 anos...

Min, apelido de Minerva, nome dado pelo pai em homenagem à deusa da sabedoria, é uma moça apaixonada por cinema antigo e de arte, cafeína e que tem ideias completamente distintas da maioria da juventude que a cerca, com um pessimismo cheio de sarcasmo e ironia. Ed, em contrapartida, é o típico capitão - co-capitão, na verdade - do time de basquete, lindo e popular, que desfila com uma namorada nova a cada semana pelos corredores da escola. Tão distintos um do outro, com grupos totalmente opostos de amigos, seria improvável que um dia pudessem se unir, de qualquer forma possível, mas, quando numa festa que Min resolve produzir para seu melhor amigo, Al, e na qual os populares do basquete aparecem sem serem convidados, a jovem repentinamente sente uma atração por Ed e, de uma conversa vaga sobre bebedeiras, selada com tampinhas de cervejas, nasce um sentimento que aflora muito rapidamente, em verdadeira combustão amorosa. Num dia não muito distante, entretanto, tudo acaba - um dos primeiros fatos que os leitores descobrem a respeito do livro (consta na sinopse, inclusive) - e Min, com o coração aos pedaços, reúne numa caixa todos os suvenires da paixão que compartilharam para devolver ao rapaz, acompanhados de cartas nas quais ela explica os motivos do rompimento.

Entre ingressos de cinema, uma máquina fotográfica, um elástico de cabelo, um caminhãozinho de brinquedo, um pacote de camisinha, um par de brincos, uma caixa de fósforos e diversas outras coisas, vamos acompanhando o desenvolvimento da narrativa que, acompanhada de ilustrações maravilhosas de Maira Kalman, é segmentada para contar a história da importância sentimental de cada um dos objetos num todo, sob o peculiar ponto de vista de Min, uma protagonista absurdamente cool, pessimista e cômica, mas, acima de tudo, apaixonada. Loucamente apaixonada por Ed Slaterton no auge de sua juventude.

Comecei minha leitura com grandes expectativas e me alegro em dizer que elas, maiores tenham sido, ainda foram superadas, uma por uma. Não posso afirmar, ao certo, se foi um caso pessoal ou se haverá de atingir a todos, todavia achei a premissa e a história de Daniel Handler tão boas e tão cativantes que terminei a leitura das 362 páginas em questão de uma tarde preguiçosa. O próprio ritmo do livro, a propósito, conspira para isso: cheio de diálogos e descrições subjetivas nas quais o recurso da vírgula, em alguns instantes, torna-se dispensável, representando a ansiedade e a pressa com a qual a mente da protagonista trabalha. Enquanto esperava por um romance meigo e sutil, deparei-me com uma paixão avassaladora, rebelde e descontrolada como é a própria adolescência, mas bem longe de ser utópica ou romântica. Realista, na verdade, em seu tom mais agudo.

E o leitor repentinamente se vê encantado com o sentimento que nutre os corações dos dois jovens e espera, espera com paciência, degustando cada valiosa lembrança de Min, procurando pelos motivos que os levaram ao término do relacionamento, que nem de namoro pôde ser chamado algum dia, torcendo por um reencontro e por uma explicação definitiva, por uma reconciliação com beijos sob gotas de chuva quando Daniel Handler nada nos dá além da verdade. Uma verdade crua, adulta e esperada, vendo as coisas de um ponto de vista natural, o que faz deste livro aparentemente comum (aquele velho papo da mocinha inteligente e reclusa com o popular maravilhoso e de bom coração), um caso totalmente à parte. Mais humano, menos fantástico; cativante e de quebrar o coração.

Não é um romance para chorar, talvez nem para pensar, embora eu mesma tenha começado a refletir sobre alguns momentos da adolescência que vivo e alguns leitores mais sensíveis possam, não tão facilmente, ir às lágrimas. É um livro para dar risada em alguns momentos, com os diálogos espirituosos não somente entre Ed e Min, mas também entre ela e Al, seu melhor amigo companheiro em todas as horas, ou com Joan, a adorável irmã de Slaterton. É um livro para sorrir, para lamentar e, acima de tudo, para se sentir aquela ternura típica de histórias adoráveis, em imagens e palavras, neste caso, pois sinto-me na obrigação dar os parabéns à Companhia das Letras pelo trabalho gráfico maravilhoso e de edição, com folhas mais duras e desenhos que falam tanto quanto as milhares de palavras da apaixonada, apaixonante Min.
"You either have the feeling or you don't."
Ou você tem o sentimento ou não tem.

Informações técnicas
Título: Por Isso A Gente Acabou
Título original: Why We Broke Up
Autor: Daniel Handler (Lemony Snicket)
Tradução de: Érico Assis
Editora: Companhia das Letras - cortesia
Número de páginas: 362
ISBN: 978-85-359-2023-9
Gênero: Romance; Literatura Juvenil

Sob o pseudônimo de Lemony Snicket, Daniel Handler publicou Raiz-forte e a coleção Desventuras em Série pela Cia. das Letras, e os livros Lemony Snicket: uma autobiografia não autorizada e O pedacinho de carvão pela Companhia das Letrinhas.
No ensino médio, levou pelo menos três pés na bunda.



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